O autônomo Carlos Rego, de 50 anos, tem uma história de vida sofrida. Ainda jovem, veio de Goiânia, no comecinho da década de 1990, tentar um emprego no Pará. Depois de muita procura, não conseguiu nada, e acabou encontrando um mecanismo de fuga dos problemas, que o levaram para uma vida de dependência química: o alcoolismo. Ele começou a morar nas ruas e passou por muitas dificuldades, como fome, descaso, preconceito e falta de oportunidade, que o fizeram desenvolver uma depressão.
Uma luz – Recentemente, o amigo Tony Frank foi resgatado pela equipe do Consultório de Rua, um programa de atendimento médico e social, ligado à Secretaria Municipal de Saúde (Sesma), por meio do qual profissionais de várias especialidades da área da saúde, como médico, enfermeiro, psicólogo e técnico de enfermagem, atendem pessoas em vulnerabilidade social. Esse "resgate" acendeu uma luz para seu Carlos, que resolveu seguir o amigo e encontrou cuidado, afeto e moradia na Unidade de Acolhimento Adulto (UAA), ligada ao Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) Álcool e Droga, da Prefeitura de Belém. Lá ele descobriu um talento: escrever poesia. Até escreveu uma, para homenagear toda a equipe multidisciplinar que atende a ele e a mais nove acolhidos na UAA e no CAPS. “Eu estou muito feliz aqui. Me sinto completo! Até um emprego eu já consegui, e agora vendo coco na Praça da República. Aqui me sinto em casa e tiro inspiração para as minhas poesias."
O CAPS é responsável por cuidados diários para os diversos tipos de transtornos mentais, casos severos e persistentes. O acolhimento é feito de segunda a sexta-feira, e a pessoa precisa apresentar documento de identidade. O serviço é oferecido por uma equipe multiprofissional. Com médicos, psiquiatras, psicólogos, terapeutas ocupacionais e assistentes sociais, os familiares dos pacientes também são atendidos. O CAPS é uma das políticas para tratar, com cuidado, atenção e afeto, as pessoas que sofrem de transtornos mentais ou que são dependentes de álcool e droga.
“Sofrimento mental grave, severo e persistente é atendido na rede CAPS, que é um serviço substitutivo de base comunitária, pois foi instituído pelo Sistema Únicos de Saúde (SUS) como o ordenador da política de saúde mental, por área de abrangência nos municípios e não mais em manicômios, alargando a possibilidade de novos repertórios de vida dos pacientes e de seus familiares”, explica o gerente do Caps-AD, Samuel Freire.
Luta antimanicomial – 18 de maio é o Dia Nacional de Luta Antimanicomial. Por isso, a prefeitura de Belém, por meio da Secretaria Municipal de Saúde (Sesma), promoveu, nesta terça-feira, 18, o evento Bazar da Loucura, para dar visibilidade ao movimento. Durante o bazar, houve venda de roupas, livros, sapatos, quadros e pinturas, além de apresentações musicais comandadas pelos acolhidos na UAA. Toda a renda foi dividida entre os participantes da ação, além de custear as despesas do bazar, que, a partir de agora, vai ocorrer todo dia 18 de cada mês.
Para a coordenadora da Referência Técnica Municipal de Saúde Mental Álcool e Drogas, Ester Souza, esse tipo de ação é capaz de modificar vidas. “O evento foi pensado para fortalecer o protagonismo dos moradores da UAA, para que possam ter formas de ganhar dinheiro, depois de sair desse lar temporário, e o bazar é uma delas. Queremos que eles possam se sustentar sem precisar voltar para a rua”, explicou a coordenadora.
O diretor de Atenção Básica da Sesma, Vitor Nina, espera que essa luta possa ter visibilidade todos os dias do ano, e não só no mês de maio. “É preciso humanizar o tratamento dessas pessoas em sofrimento mental. E não é com carga excessiva de remédios, como faziam no passado, que se vai tratar a doença, e nem trancafiando o paciente em um hospital psiquiátrico. Ele precisa poder experimentar, ter opções, se exercitar, se capacitar e ter a vida mais plena possível."
História – O 18 de maio, Dia Nacional de Luta Antimanicomial, rememora o célebre encontro de Bauru-SP, realizado em 1987, quando os principais envolvidos no cuidado às pessoas com sofrimento mental marcharam em defesa do tratamento em liberdade. O slogan “Por Uma Sociedade Sem Manicômios”, usado no evento, passou a ser fonte de inspiração, para dar um basta na, até então vigente, lógica de tratamento baseado na exclusão e na segregação em manicômios e hospitais psiquiátricos.
>> Leia mais: Assistência à saúde mental e luta antimanicomial no município de Belém
Texto: Carolina Boução
 
								 
															 
											 
								 
															 
								 
								 
								